02/02/2009

DIA DE FESTA NO MAR

Num dos extremos do percurso da festa, o mais próximo da minha casa, o módulo policial, ainda desativado, afinal eram 06h00. Passa lá 15h00, passa... Vai estar cheinho, cheinho....

No Largo da Mariquita, o início das mudanças no trânsito

Comprei logo minhas flores, porque achei que mais perto do fervo ia estar mais caro. O vendedor, maior simpatia. Avisei que ia tirar foto das flores, ela falou: aproveita e tira uma foto minha com o buquê na mão!

Chegando perto da colônia de pescadores, desci uma escadinha que dá para as pedras, pensando em fazer uma oferenda mais intropectiva dessa vez.Como não tenho o hábito de fazer longas orações de agradecimento (sim, a gente tem que agradecer mais do que pedir, pedir é feio!), e na verdade eu estava tão excitada com aquilo tudo acontecendo, tanta gente, tanto barulho, tanta coisa para ver, eu me desconcentrei total, eu pensava: onde eu estava mesmo? Achava muito mais interessante ver as pessoas à minha volta, olhar a paisagem, do que propriamente bancar a fervorosa. Quando chegou um cara todo arrumadinho, camisa, calça e sapato social brancos, e tirou da sua sacola um coco verde que devia ter um preparado muito especial, é que eu vi que aquilo, aquela reza, aquela entrega, era coisa para quem realmente tem fé. O cara fez seu cântico em voz baixa, bateu suas palminhas de modo discreto e silencioso, aquilo era importante para ele. Bem diferente de eu e meu papo de "onde eu estava mesmo?". Aí eu desencanei e subi a escadinha, para ver o resto da festa.

Até pensei em ir pelas pedras, mas pensei que se havia um caminho mais fácil, para que complicar?

Passei batido pela fila que as pessoas faziam para para depositar suas oferendas em balaios que vão para alto-mar. Desci a escadinha para a praia dos pescadores, onde haviam vários espetáculos a céu aberto, ainda bastante autênticos, mas alguns já um pouco sob encomenda para turistas e baianos interessados em desembolsar algum.

São oferecidos passeios rápidos de barco para que as oferendas sejam deixadas no mar.

Havia várias barracas instaladas na praia, algumas se preparavam para rituais, outras davam sinais que mais cedo tinham armazenado oferendas que já tinham ido para o mar.

Havia também vários iniciados no camdomblé (não sei como se chamam) com barracas com folhas, água de cheiro, sal grosso, arroz, enfim...
Um desses me chamou, falou que Iemanjá falou para ele que queria falar comigo. Bem, eu já tinha resistido ao assédio de umas baianas ao pisar na areia no início da praia, e chega uma hora em que vc pensa: eu estou na festa de Iemanjá, tenho que tomar um banho de cheiro e limpar minhas energias". Claro que no final do ritual, eu tinha que deixar R$ 20,00 para Iemanjá, mas por sorte eu saí apenas com R$9,00. Cincão foram nas flores, e assim, me desculpe Iemanjá, mas vc ficou com R$ 4,00. Minhas três rosas brancas, que eu estava vendo que eu não tinha onde deixar, foram providencialmente convidadas a ficar lá na barraca do chegado de Iemanjá.

A parte mais bonita da festa: uma roda que eu acho que era de umbanda

É emocionante ver como pessoas do dia a dia ficam majestosas

É uma comunhão com as forças da natureza. Ali, na areia, no mar, é o melhor lugar para aquilo tudo ocorrer. Tudo fica simples, tudo faz sentido, tudo deve ser louvado e agradecido. Estar ali , compartilhar aquele momento com aquelas pessoas, é uma dádiva.


Fui cedinho para a festa em homenagem a Iemanjá, realizada todos os anos no dia 2 de fevereiro, na colônia de pescadores do Rio Vermelho. Não tão cedo a ponto de ver a Alvorada, quando há um estourar de rojões e há a "inauguração" oficial da festa, ao amanhecer.

Desde ontem já havia pessoas depositando suas oferendas no mar. A fila na colônia, que fica ao lado da igreja de Santana, é grande desde cedo (cheguei lá às 06h30 e sem chances, fiquei com minhas três rosinhas brancas na mão, pois Iemanjá não faz conta se eu entrei na fila ou se joguei no mar, néam?).

Uma iniciativa louvável é a do Instituto Nzinga de Capoeira Angola, que está realizando uma campanha de conscientização para que as oferendas sejam menos nocivas ao meio ambiente. Contudo, há resistência por parte de líderes do candomblé.

Vejo que isso precisa ser trabalhado, e muuuuito. Alguém precisa usar esses métodos educacionais intelectualizados todos que estudam nas escolas de educação, nos mestrados e nos doutorados da vida, nas questões de aproximação da linguagem popular, para explicar para a galera que Iemanjá é vaidosa sim, mas ela é um orixá, muito mais antigo que a gente. Que nós somos uma abstração perto dela, que sabonete, boneca de plástico, tudo isso surgiu depois dela, então ela não pode fazer questão disso, que é apenas uma representação.

Isso me irrita. Como assim, se Iemanjá não gostasse disso, não dava mais peixe no mar? Já não está dando, e com todo o respeito, não é em decorrência da vontade de Iemanjá não. Então, Fundação Cultural, pega um pouquinho dessa dinheirama que tu joga nessas festas bizarras de shortinho e bunda de fora e investe no processo educacional ao longo do ano para essa galera do candomblé, que merece todo o respeito, mudar um pouco a opinião sobre a questão das oferendas.

Mas ante a grandiosidade da festa, essas questões, embora importantes, ficam secundárias. Não chegam a estragar o meu humor, embora eu as observe. Há modos e modos de curtir a festa. Por pouco que eu a conheça, eu acho que o melhor dela se dá na areia. Nos detalhes, nos cultos, nas crenças das pessoas.

Quando eu tinha quatro, cinco anos de idade, morava no Rio de Janeiro com a minha mãe e meu pai (último ano antes deles se separarem). Passamos um Ano Novo na praia, acho que em Copacabana, e tinha aquela festa toda, mas o que mais me chamou a atenção foram as baianas do cambomblé.

No ano seguinte, eu e minha mãe passamos o Ano Novo em Piracicaba, na casa da minha vó, aquela caretice total, bem família. Uns dias depois da festa, eu, intrigada, perguntei para a minha mãe se aquele Ano Novo que a gente comemorou em Pira era a mesma coisa daquele Ano Novo (afinal de contas tããããão animado) do Rio.

Pois é, vivam as baianas, viva a manifestação religiosa africana, viva o pé na areia, viva a oportunidade de poder comer uma feijoada e sair da dieta!

Um comentário:

  1. Anônimo1/1/10 17:09

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