27/12/2010

MAPS

Proximidades da minha (?) casa em Curitiba. 2009.


1996. Ainda apaixonada pelo Mário, com quem eu havia começado a namorar no ano anterior, voltei para Curitiba.

Não tinha internet. Não tinha celular. Não tinha torpedo, Facebook, Twitter. E sinceramente, acho que o Mário não usaria muito essas coisas. 

Tinha o que continua tendo: telefone - com interurbanos caros - e correios, onde a gente podia mandar e receber cartas com desenhos e mil palavras.

O caso é que quando voltei para Curitiba, o Mário estava namorando. 

A gente não namorava mais, mas eu sabia que ele gostava de mim. E eu o amava. 

Fui lá no bar que ele tinha, falei que tinha voltado,. Não foi fácil ter coragem para chegar lá na cara dura e conversar com ele na cozinha.

Não dava, ele gostava da menina.

Chorei, me arrastei, implorei. O que havia de ser maior que o meu amor por ele? (bem egocêntrico isso)

Fiquei num inferno mental. Ia aos shows, via o M. sozinho, ela nem sempre ia.

Eu e o Mário sempre fomos muito amigos, tínhamos muita coisa além do namoro. 

Além de tudo, vários amigos torciam por nós.

Um dia, perguntei a um deles onde o M. estava morando.

- Vc vai até o terminal não sei qual, anda tantas ruas, vira à esquerda, é a terceira casa, de portão azul.

Numa manhã, ao voltar da night, ouvi tanto PJ Harvey que achava que ela me entendia.

Tomei banho e fui para a casa dele.

Procurei, procurei, perguntei para várias pessoas, mas nada.

Até que, não sabendo mais se eu estava à esquerda ou à direita, se tinha andado dezenove ou vinte e sete quadras, eu achei uma casa de portão um pouco azulado.

Tinha um gramado e uma criança brincando num balanço.

Uma mulher veio e me atendeu. Perguntei:

-Aqui é a casa do Mário?

Sim, era.  Ela perguntou o que eu queria com ele. Falei que era coisa nossa.

Então ela me falou que o Mário era marido dela.

Hã? 

Alguma coisa não estava certa. O M, casado e com uma criança brincando no balanço de uma árvore?

- O Mário, um grandão, assim, assado?

- Não, o Mário é meio baixinho, até.

Ah, tá.

Achei melhor ir para casa e dormir um pouco.

15/11/2010

ON THE WIRE



Faço votos perpétuos de recomeços.

26/05/2010

DETONATION INC

Desmatamento em área de Mata Atlântica. Litoral Norte, Bahia, maio de 2010


Esse ano tenho trabalhado mais que em 2009, quando eu fingi que não vi meus chefes e eles fingiram que não me viram.

Se eles me deram trabalho para fazer agora, eu como boa moça, estou fazendo. Eis que durante uma inspeção naquelas empresas que eu AMO, as que plantam, Eucalipto e que estão SEMPRE certinhas, eu vejo um desmatamento num terreno vizinho.

O carro com os dois caras da Empresa foi andando na frente, enquanto eu e minha querida, amada e leal amiga e colega Anna pedimos para o motorista parar para a gente dar uma olhada naquela, por assim dizer, merda total que estava diante de nossos olhos.

Descemos do carro. Ficamos em silêncio. Embora a repartição não tenha procedimentos, a gente tem. Ou foi adquirindo, pela nossa sintonia e convivência, dentro e fora do trabalho.

Começamos a andar pela estrada, sem entrar na área. Só vendo qual era a situação. Ela com o GPS, eu com a máquina. Somos uma dupla, e gosto que seja assim.

O estrago não é pequeno. Me sinto tomada por uma revolta tão, mas tão grande, que dá vontade na hora de ir lá ver quem é o imbecilis da silva que tá fazendo aquilo.

Não dá.  Não é assim.

A gente não foi para lá preparada para isso. Não seria eficaz nem seguro. 

Estávamos sem destacamento policial, estávamos com os caras da empresa nos esperando para vermos outra área, enfim, estávamos  totalmente despreparadas. E na verdade, não sabíamos o que fazer.

Anna  se lembrou imediatamente daquele motorista do trator que vimos no areal que tinha uma morte nas costas. Para esse povo, que está em condições trabalhistas ilegais, em atividades clandestinas, se envolver num outro incidente não custa.

Os caras da Empresa voltaram com o carro. Um deles, solícito que só, fala: 

- Olha, nem adianta olhar desse jeito não, essa área não é nossa.

Eu, quieta, pois hoje em dia não sou mais aquela louca ruiva estridente, que ficava falando que aquilo é um absurdo, onde será que estava aquele filhodaputa daquele dono daquela área, blábláblá, falei apenas:

- Sei.

Depois, calmamente, perguntei se ele teria como dar para a gente os dados daquele confrontante. Dados do proprietário do imóvel rural, nome, CPF etc. Sim, porque a multa teria que sair no nome de alguém.

Ele disse que sim, pois estavam fazendo esse trabalho de georrefereciamento e cadastramento para o INCRA.

Dias depois, não sem um pequeno esforço de nossa parte na repartição, e sem um retrocesso da Empresa no fornecimento dos dados do infratores, voltamos à área.

Não foi bom.

06/04/2010

O ELEFANTE CAIU NA LAMA


Fotos: Agricultura de Sequeiro em Formosa do Rio Preto, Oeste da Bahia. 2005.


PORTARIA Nº 12.449 DE 05 DE ABRIL DE 2010. O Diretor Geral do INSTITUTO DO MEIO AMBIENTE - IMA, no exercício da competência que lhe foi delegado pelas Leis Estaduais nº 10.431/06 e 11.050/08, regulamentadas pelo Decreto Estadual nº 11.235/08 e tendo em vista o que consta do Processo nº 2009-014381/TEC/ASV-0719, RESOLVE: Art. 1.º - Conceder AUTORIZAÇÃO DE SUPRESSÃO DA VEGETAÇÃO NATIVA relativo a uma área de 954,0248 ha, para Implantação de Agricultura de Sequeiro, delimitada conforme poligonal formada pelos pontos sob coordenadas geográficas: Lat. – 13°55’23’’; Long. – 45°32’49’’ e coordenadas UTM (X/Y): S1: 435.979/8.460.396; 436.367/8.460.771; 436.764/8.459.949; 436.783/8.459.909; 435.302/8.459.275; 434.629/8.460.695; 435.743/8.460.997; S2: 445.993/8.464.094; 444.660/8.463.136; 444.555/8.463.333; 441.458/8.461.645; 441.630/8.461.338; 440.912/8.460.894; 436.902/8.459.663; 437.084/8.459.832; 438.719/8.461.166; 439.624/8.461.426; 440.105/8.461.325; 440.718/8.461.803; 441.554/8.461.879; 441.616/8.461.931; 442.779/8.462.940; 443.160/8.463.090; 443.548/8.463.306; 443.668/8.463.362; 444.369/8.463.367; 444.403/8.463.787; 445.326/8.463.942; 445.394/8.463.985; 445.201/8.464.222; 445.824/8.464.455 à AGRIFIRMA BRASIL AGROPECUÁRIA S/A, inscrita no CNPJ sob nº 09.288.977/0001-20, na Fazenda Santa Luzia, localizada no município de Jaborandi, mediante o cumprimento da legislação vigente e dos condicionantes constantes da íntegra da Portaria que se encontra no referido Processo. Art. 2º - O rendimento de material lenhoso gerado foi estimado em 11.447,37 m³  ou 17.171,06 st de lenha ou 5.723,68 mdc. Art. 3º - Os produtos e subprodutos originados de atividade autorizada deverão ser aproveitados conforme estabelecido no Art. 115 da Lei 10.431/2006 sujeitando-se o transporte ao Art. 144 da mesma e às Portarias SEMA nºs161/2007 e 162/2007. Art. 4º - A autorização de supressão de vegetação, para a produção de carvão vegetal exige a licença ambiental. Art. 5º - A comprovação desta publicação será mediante a apresentação do certificado. Art. 6º - O descumprimento pelo requerente das atividades previstas no Projeto Técnico anexado ao processo torna nulos os Artigos anteriores. Art. 7º - Estabelecer que esta Autorização, bem como cópias dos documentos relativos ao cumprimento dos condicionantes, sejam mantidos disponíveis à fiscalização do IMA e aos demais órgãos do Sistema Estadual de Meio Ambiente – SISEMA. Art. 8º - Esta Portaria entrará em vigor na data de sua publicação e é válida pelo prazo de 01 (um) ano. PEDRO RICARDO SILVA MOREIRA – Diretor Geral


É piada e não é de bom gosto.

Porque não FECHAM logo as portas do Órgão Estadual de Meio Ambiente? Seria mais honesto.

ALBEDO


 Parecia ser "apenas" mais um areal irregular. Relevo totalmente modificado, vegetação suprimida, indícios de movimentação de veículos.



Logo na entrada, a abordagem clásica dos incansáveis  policiais da COPPA ao condutor da primeira caçamba. O sujeito, que terminava o carregamento de areia,  desceu da carroceria.


"Sou sargento da PM"

Meus ouvidos se aguçaram. Minha porção caga-regras já imaginou: O quêêêêê? Da Polícia e participando assim, deslavadamente de uma infração? O Sr. tem noção que é a própria Polícia a responsável pela segurança nessas Operações?

Mas fiquei ali, no ladinho, só fingindo que não estava observando.

Os policiais perguntaram apenas: "o Sr. é da Reserva?". E conferiram os documentos. Simples, sem dramas, sem grandes casos.

Enquanto isso, a equipe se dissolveu, cada um caminhando rumo a maiores informações. Tentando ver se entendia a real dimensão daquilo que estava acontecendo.








 Havia solo desagregado circundado por manchas de mata testemunhas da mineração. Havia sol, aridez, calor. E fui percebendo que havia muito, muito mais gente lá dentro que eu pudera imaginar.




Os meninos do Escritório Regional confirmam: sim, aquele areal é o mesmo que eles haviam interditado há cerca de um ano. O encarregado apresenta notas de saída das carretas.


Saem, por dia, cerca de 90 carretas. Umas maiores, com 12 ou 13 m3, outras menores, com 8. Uma de 8 paga R$ 120,00. O cara passa lá na matiz da Fazenda, paga, e vai ao areal com uma ordem de saída de areia.

Ou seja, o proprietário da área tem, por baixo, uma renda de R$ 10.000,00 por dia. Duzentos mil por mês, se não trabalhar aos findis. Trezentos mil se trabalhar, ou melhor, roubar de sol a sol.

Sim, porque além dele não ter licença ambiental para a tividade, está ROUBANDO recurso mineral da União. Para um cara desses o crime ambiental compensa. Tanto é que ele não deu a MÍNIMA para a interdição à qual estava condicionado.

Claro, né? Quando se tem um sobrinho que é AMIGO do governador, tudo é tão tranquilo...

Eram duas, três, quatro, DEZ caçambas.


O patrão, ao saber que algo tinha saído errado em seus planos, pediu logo pro funcionário passar o celular para os fiscais. A Capitã então falou:

"Não posso falar com ele, estou trabalhando"

ATORON!!!

Aí o Sr. Areia liga pro sobrinho, que vai, em Salvador, direto para a Repartição, reclamar que o tio estava sendo mal atendido pelos fiscais. E que era uma vergonha para o tio, pessoa pública e importante, ser levado pela gente para a delegacia.

Não dá, colega, não dá. Alguém esqueceu de avisar o sobrinho que o tio nem pisou no areial naquele dia e que a gente nem sabe a cara dele. E acho que esqueceram de avisar lá na Repartição que não deviam atender esse tipo de gente sem hora marcada.

Muito barulho por nada. Quem foi para a delegacia foram SÓ as dez caçambas e o trator que foram encontrados no local, juntamente com TODOS os ELEMENTOS que lá estavam.

Inclusive aqueles dois que estavam entrando no Areial e que quando viram a gente, tentaram dar meia volta. Falaram que só entraram porque a gente chamou, pois na verdade estavam indo para outo local. E que não vendiam areia não, que aquele anúncio de venda de areia estava na carroceira porque o antigo dono do veículo o fazia.

Vamos, então, resolver tudo isso na deléga?


Todos enfileiradinhos, bem bonitinhos, tá?



O que entrou POR ACASO no Areal falou que a caçamba quebrou. Ohhhhh, coitado, que coisa, quebrar bem na hora do deslocamento, né? 

Fico DE CARA com a ousadia desse povo. Se fosse eu que tivesse lá no monte de fiscais e policiais, eu ia fazer tudinho, é Sim Senhor e Não Senhor. Os caras ainda tentam de todo modo burlar, contornar uma situação que está mais que óbvia....


Quando soube que tudo bem, ele podia não ir, mas os documentos deles ficariam retidos, ele consertou o carro rapidinho.

E lá fomos nós naquele comboio gigante pela estrada, parando a cidade até chegarmos à Delegacia.


O Delegado foi simplesmente FANTÁSTICO, abraçou nossa ação com muito entusiasmo. Os agentes da Polícia local disseram que já tinham pego o cara em situação irregular, mas ele apresentou as notas, dizendo que o negócio estava totalmente regularizado, e ainda ameaçou processar os agentes.

Nessas horas, me sinto completamente FELIZ com o meu trabalho. São raras, mas existem. E pagam qualquer grana que eu fosse ganhar trabalhando numa estrutura privada, em prol de dilapidação dos recursos naturais. Se máquina nenhuma funciona, que eu esteja na que mais me sinto representada, a mais isenta, por princípio (embora não por prática).


Burburinho na frente da Delegacia. Todos os veículos e chaves lacrados, aguardando o inquérito.

A galera de Repartição, em Salvador, teve a  manha de ligar para o telefone fixo da Delegacia para falar conosco, já que nenhum de nós atendia o celular qdo via que era da lá. Me sensibilizo com tanta atenção. Era o segundo contato com fundo político que o people da Sede fazia conosco no mesmo dia.

Eu já terminei meu processo da carreta. Quanto à multa diária do areal, estou esperando para assinar.

05/04/2010

PULGUENTO

Acajutiba - BA, março de 2009.

Chegamos noutro areal. Eu já descrente de resultados efetivos da Operação, pensando logo em chegar em casa. A casa para a qual eu havia mudado numa sexta e a qual havia deixado, cheia de caixas com as coisas da mudança, na segunda imediatamente posterior.

Eu podia ter dito na repartição que não queria viajar porque era minha semana de mudança, mas não quis dar essa deixa para ser classificada de reativa. Mas após uma semana de Operação, meu balanço dos resultados não estava sendo dos mais animadores.

Era MUITA falta de planejamento. Como assim gastar horas para se deslocar para uma cidade e lá, na hora, que frequentemente era a mais imprópria, procurar a Prefeitura? 

"Ah, queríamos saber onde tem maior incidência de tais infrações aqui no município".

Alo-ow! É claro que os caras só vão falar o que quiserem, né Bial? Esse "procedimento" (ou falta de) é TÃO diferente daqueles em que íamos visitar as Prefeituras do Sul e Extremo Sul na Operação de Silvicultura... E porquê, para quê? Qual é a função da galera de Fiscalização, especialmente os que ficam nos Escritórios Regionais?

Não temos seminários internos, feitos por nós e para nós, não temos espaço nem vontade de discutir nada. Cada um vai achando um problema e resolvendo do seu modo, na maioria das vezes capenga. E fica assim, porque as esferas acima estão ENTUPIDAS de coisa para resolver.

E a Instituição vai andando. Como bem diz um colega meu, carece a de cabelos brancos, "não é o cachorro que balança o rabo, é o rabo que balança o cachorro".

02/04/2010

PRIMATA

 Foto: eu, mamis, Lu e Flá no Playcenter, 1975

Talvez meu apreço por homens decididos seja inspirado pelo King Kong. Preciso de caras que me façam voar, como King Kong fazia com os aviõezinhos no filme. E que me olhem com a delicadeza daqueles imensos olhos de bicho.

Preciso de MAIS, e não de MENOS. 

CONTROLE




Esquematizadazinha, metida a certinha, fominha. Nuns dias.

Preguiçosa, letárgica, relapsa. Noutros.

Talvez meu corpo seja apenas o laboratório prático do coquetel de adrenalina, serotonina, endorfina e outros neurotransmissores que me guiam. Tentei e realmente ocnsegui, após alguns anos de terapia e outros de remédios, dar uma melhorada na minha impulsividade.

Já consigo me calar-me em situações onde antes eu ne esperaria o sujeito terminar a frase. Fico olhando, asism, pensando se ninguém vai dizer nada. Aprendi que muitas vezes a coisa é tão óbvia, minha reprovação à situação é tão evidente, que eu nem preciso dizer.

Mas às vezes não dá.

O caminhão veio chegando, chegando. Estávamos na estrada, todos paramentados.

"Oi, bom dia, tudo bem, somos de tal lugar, estamos verificando a presença de animais silvestres nos veículos, o Sr poderia abrí-lo?".

E quando vi aquela carreta vindo em minha direção, pensei: é agora. Estava sem NENHUMA documentação de comprovação de origem da matéria-prima. E eu sabia para onde estava indo. Sim, tava indo para virar carvão daquela empresa que, como todas, sempre pede para a gente aliviar. Aquela que é ÓTIMA e nunca é resposável por nada.

Perguntei aos meus colegas se aquilo se configurava em infração. Recebi resposta positiva e a  informação que eles estavam agindo de forma continuada. Delegacia. Termo circunstanciado.

Chororô. É sempre a mesma estória. Ah, doutora, eu não tenho culpa. Ah, não faz isso, eu sou trabalhador e gero empregos. Dessa vez, botaram a culpa no motorista.

"A Sra. sabe como é, esse pessoal sai correndo para chegar logo ao destino, ng mandou ele sair com a carreta, ele saiu sem avisar e nem pegou a nota fiscal. Isso nunca acontece, a gente trabalha com isso há mais de 20 anos".

Olhei pro cara, pensei em dizer que  CLARO  que o motorista saiu correndo com o caminhão, porque os patrões sempre ficam ESCRAVIZANDO-os com os horários. Mas deixei meu discursinho libertário para outra hora. Só disse que se ele trabalha com isso, sabe que deveria ter a nota fiscal.

E, como tudo na vida,  um dia acontece. Aconteceu, Bial. Perdeu. Sinto muito, mas essa nota que vc está me apresentando foi emitida HOJE e a ingração coorreu ontem.

Expliquei isso para a tuma do deixa disso e perdi meu dia todo na deléga. Mas ganhei o mês. Achei estranho os caras da Empresa não aparecerem e deixarem os caras da terceirizada se virarem sozinhos.

Segunda-feira, na repartição, um cara da Empresa me liga para falar que aquilo não existe. Lamento, mas existe. Esse auto de apreensão que vc tem em mãos existe, queridinho. Ah, vcs não precisam de documentação, porque têm um acordo com não sei quem? Legal, vc pode me apresentar isso por escrito no prazo de 20 dias. Não, não dá para reverter. Ah, sei... Claro, fique à vontade para falar com meus chefes.

A-D-O-R-O!

28/03/2010

TERRA DE ALGUÉM







B - Tá vendo o cara com a caçamba? Vc pede para ele parar o serviço e desprezar a carga.

A - Tá.

(caminham em direção aos INFRATORES)

A - Olá, bom dia, vcs são os responsáveis aqui pela área?

X - Não, moça, a gente só vem pegar areia.

A -Ah, tá. Vcs tem assim, alguma documentação, licença, autorização para fazer isso?

X - Não, a gente só vem aqui pegar mesmo.

(A, B e C fazem perguntas básicas: para onde vai, há qto tempo explora, quem são os envolvidos).

G - A documentação do veículo está atasada, a habilitação dele vencida.

B - Vcs poderiam esvaziar a caçamba, por favor? E aguardem, pois quando formos para a cidade, vamos todos juntos, levar a caçamba para a Delegacia, tá?

27/03/2010

ASHES TO ASHES

 Início de um dia de trabalho - Inhambupe

A - E no areal de seu José Carlos, vai rolar multa?

B - Ah não, tadinho, ele é pobre, coitado. A gente só vai interditar e pedir para ele se regularizar.

A - Ahã.

(silêncio)

A -Eu tirei umas fotos desse pedaço aqui. Como sempre, vários danos ambientais estão associados. Não bastasse ele minerar sem nunca te obtido licença, a APP dele tá completamente detonada, secou o rio, usa mão de obra familiar sem condições de trabalho... É o dano social aliado ao ambiental.

B - Esses buracos aqui, ele disse que vai usar como tanques para peixe.

A - Sei.

(silêncio)

A - Mas o certo seria ele revegetar tudo, né? Apresentar um PRAD. Porque senão ele minerou ANOS na ilegalidade, aí diz que não quer mais e ainda tem outra atividade econômica em cima do dano ambiental.

B - Ele é pobrezinho, coitado.

C - Mas tem carro. Vc viu ele com a chave do carro dele? Eu demorei anos para poder comprar meu carro, porque só o fiz qdo pude arcar com as consequências de tê-lo.

(silêncio)

A - E esse forno?

D - Está abandonado, ele não faz mais nada aí.

A - Sim, mas ele fazia. Explorava o recurso natural da forma mais impune posível. Claro, a gente é muito incompetente, NUNCA foi feito um mapeamento dos areais em cada região, e planejada uma ação realmente EFETIVA de resolver essa questão.

C - Sei lá tb o quanto adianta a gente se preocupar com isso se a própria instituição autoriza MILHARES de supressões de vegetação em biomas ameaçados.

A - Sim, qual é a POLÍTICA de gestão, o que realmente a instituição quer?

(silêncio eteno)

A BALANÇA

 Forno abandonado de carvão em Inhambupe - BA

Qual é a diferença entre o seu Joselito do carvão e seu Moisés do Areal? E como fica seu José Carlos no meio disso tudo? O fiel da balança não pode ser subjetivo quando se trabalha com LEIS.

I'm so sorry, mas na prova da segunda fase do concurso que fiz para exercer a função que exerço a gente só tinha um foco: legislação ambiental. Acho que isso era importante, senão a galera da repartição não ia tirar do nada, iam preferir falar de influências político-econômicas na gestão pública. Talvez fosse mais sincero.

Depois de anos, esbarro sempre na mesma coisa: Ah, não vamos multar seu Coisinho, porque ele é pobre. E o seu Coisão tb não dá para multar, porque, sabe como é, nunca dá em nada. Então, a rigor, a gente faz o que, pelamordedeus? Finge que trabalha?

Se é para fingir, sou mais ficar escolhendo a cor do meu próximo esmalte. Mas é o seguinte: se me chamaram pro campo, vou ter que trabalhar. Sem essa de fingir que trabalho, em pleno campo. É lá que se tem a oportunidade única de se registrar o que realmente ocorre.

Apesar de ser onde realmente se efetiva o olhar que a instituição deve ter sobre seu objeto (meio ambiente, alguém já ouviu falar?), há um despreparo total para enfrentar as situações de campo. Porque, entre outras coisas, não há uniformidade.

Não aquela uniformidade que engessa, mas a homogeneidade necessária para que as decisões não sejam toscas, amadoras.
Aí a gente se enconta com seu Joselito, tadinho, cuja filha de 12 anos parece saída de uma foto de Sebastião Salgado. É até um desrespeito fotografá-la cheia de fuligem, no início de sua adolescência, ali, naquela nesga de tera, alijada de todo e qualquer futuro cidadão.

Sim, eu sinto muito e a conversa com seu Joselito deve ser a mais conciliadora possível. Agora, o que não dá é para fingir que não viu o forno de carvão dele. Não dá para não falar que ele precisa se regularizar.

Mas o consenso, essa imposição da maioria, travestido de processo democrático, nos leva a abrir mão. O perigo é que nisso, já levaram não só o braço, mas o corpo todo e tambémn a alma dos que pensam que com o curto alcance do braço de fiscal estão conseguindo intervir, de modo significativo, na realidade social.

22/03/2010

NEM COM REZA

 Culto religioso - Inhambupe - BA - 02/03/2010

Depois de dois anos sem participar de Opeações de Fiscalização, resolveram me escalar novamente. Havia um acordo tácito: não me incomodem que eu não os incomodo. Resolveram quebrá-lo, e eu, como sou boazinha,  não falei "não".

Pensei nos pontos positivos e decidi que não seria uma boa hora para ser reativa, o que de maneira alguma significou que correu tudo às mil maravilhas. Aliás, é uma coisa quase certa: não vai correr tudo bem numa estrutura de faz-de-conta.

Começou antes de ir: avisam a gente por e-mail. Nessas horas vejo a decadência da área técnica, da gestão. Não tem mais reunião de planejamento da Operação, de alinhamento, de nada. Aliás, reunião para quê? O lance é cumprir as metas, o lance é no final do ano falar que fizemos 30 Operações, X apreensões, Y interdições.
Para quê, porque, como? Não interessa, e para de questionar. Para onde o órgão quer caminhar, qual a finalidade das ações, quais os procedimentos? Ah, cala a boca e não enche o saco!

Não quis fazer a estressada, mas me lembrei da época em que ainda achava que minha dedicação podia REALMENTE influir nos rumos do lugar onde eu trabalhava: se vc não grita, nada sai. Então, fui procurar saber quais eram os objetivos da Operação, como ia ser a logística, quais eram as rotas, como a gente estava da mapa, enfim, coisas que até a pessoa mais limitada pensa em fazer.

Mas claro, eu sou ansiosa e criadora de caso, para que saber? Afinal eu sou experiente, sei tudo (é aquela velha desculpa- eu confio em vc, vc é bala, vai lá e se vire), a Operação está redonda e mais detalhes vcs terão no  dia da chegada.

Ah tá, então a gente vai perder um dia que poderia estar trabalhando efetivamente, tendo reunião, sendo que podia tê-la aqui? Zuzo bem, só para saber.

Qdo entrei no carro, o motorista já avisou que o mesmo não devia nem estar rodando. ADORO! Adoro viajar em carro que não está apto para o trabalho! Ainda mais agora, que eles são alugados, acho MASSA a repartição ter um contrato com uma Empresa que nem é da Bahia, que oferecia carros que não eram nem plotados (assim algumas pessoas nomeadas pelo PV podiam usá-lo para ir dar aula na faculdade sem dar bandeira), e que não tem nem competência para colocar um carro decente em substituição a algum que quebra.

Assim, torceríamos para aquele carro não quebrar, e se a gente fosse em terreno de difícil acesso, não poderíamos ir sozinhos, já que havia risco REAL e aumentado de uma quebra. Tem nexo escalar um carro que não pode se distanciar de outros numa Operação? Ou o povo que vai estar no carro vai fazer só figuração? Ah, vem  cá, mas reunião de planejamento para quê, né?
Ao descobrir que o ar não funcionava  e os vidros traseiros não abria (melhor que isso, só se tivesse um aquecedor permanentemente ligado), pensei, apertada num bando traseiro onde não havia espaço para minhas pernas: essa vai ser minha última Operação!

Pilates para quê, se minha coluna já estava doendo? Ergonometria? Nem pensar, vc é experiente e enfrenta todas, vá para a Operação. Lembrei de todos os técnicos, concursados como eu, que se submetem a andar de ônibus, muitas vezes pagando a passagem para receber depois. Fiquei pensando que realmente não há limites, e se vc impõe limites, fica mal vista. 

Minha aceitação para participar da Operação estava provando que após dois anos eu estava disposta a relevar algumas coisas, mas que se tinha havido alguma mudança, decididamente ela não tinha sido para melhor. Apostam cotidianamente no  EMBURRECIMENTO das pessoas. Ficam incutindo que fazer tudo isso, enfrentar a incompetência gerencial e técnica é edificante, que a gente é uma espécie de Indiana Jones.

Só que a gente não é. A instituição não tem procedimento NENHUM documentado, ao contrário do IBAMA, que mesmo assim enfrenta as dificuldades sabidas. 

Chegando no Escritório Regional, os meninos de lá falam, felizes com nossa chegadam: vem cá, vcs que estão chegando de Salvador, digam para a gente como vão ser as coisas.

Hahaha, é para rir?